STATEMENT
A fotografia, para mim, é um lugar de escuta. Uma escuta do mundo e de mim mesma. Caminho com uma câmera como quem recolhe vestígios: de tempo, de luz, de silêncio. Acredito na potência da imagem como instrumento de afeto e de transformação. Desde cedo fui ensinada a não ser indiferente ao sofrimento do outro e este ensinamento se reflete nas imagens que construo, marcadas por uma ética da atenção, da escuta e da partilha.
A minha produção artística tem como tema central a paisagem criada como ficção do real e os meus trabalhos são construídos a partir da relação entre o corpo e o espaço. Não apenas o corpo físico, mas o corpo que sente, que silencia, que lembra. Produzo autorretratos como um gesto de presença e resistência. Através do meu corpo, interrogo o lugar da mulher em uma sociedade patriarcal que insiste em nos calar. Fotografar-me é, ao mesmo tempo, me proteger e me expor. É dar rosto àquilo que não se diz, mas que arde.
O caminhar livre é meu processo. É assim que deslocamento físico se transforma em pensamento. A cidade, os vazios, os cantos esquecidos, as frestas do real, tudo isso me guia. O olhar surge a partir do encontro. A imagem não é planejada, mas intuída. Sinto antes de compor. Escuto antes de fotografar. E só então, quando algo pulsa, registro.
Trabalho com fotografia analógica porque o grão e o intervalo entre o disparo e a revelação me conectam ao tempo real das coisas. Uso o filme preto e branco como linguagem e a dupla exposição como estrutura de pensamento. Para mim, sobrepor imagens é sobrepor camadas de experiência, criar fissuras entre o visível e o imaginado, entre o corpo e a paisagem, entre o real e o simbólico.
Minhas imagens falam de silêncio, não como ausência, mas como matéria. O silêncio é o que vibra entre uma camada e outra da exposição. É o que atravessa o corpo e reverbera na paisagem. Meus trabalhos mais recentes investigam essa escuta visual: uma maneira de resistir ao excesso de ruído do mundo e, ao mesmo tempo, dar forma àquilo que insiste em permanecer. O que busco, com cada série, não é uma resposta, mas uma pergunta aberta. Desejo que as imagens toquem o espectador no campo do sensível, do instável, do íntimo. Que convoquem memórias, afetos, presenças. Que criem mundos possíveis.
Faço da fotografia meu modo de existir: ética e sensorial. O que me move é o desejo de criar imagens que, mesmo em sua fragilidade, ressoem. Que não apenas mostrem, mas permaneçam. E que sejam sementes de mudança.
Photography, for me, is a place of listening.
A listening to the world and to myself. I walk with a camera as someone who gathers traces: of time, of light, of silence. I believe in the power of the image as a tool of affection and transformation. From an early age, I was taught not to be indifferent to the suffering of others, and that lesson reverberates through the images I create, marked by an ethics of attention, of listening, and of sharing.
A listening to the world and to myself. I walk with a camera as someone who gathers traces: of time, of light, of silence. I believe in the power of the image as a tool of affection and transformation. From an early age, I was taught not to be indifferent to the suffering of others, and that lesson reverberates through the images I create, marked by an ethics of attention, of listening, and of sharing.
My artistic practice centers around landscape as a fiction of the real, and my works are built from the relationship between body and space. Not just the physical body, but the body that feels, that holds silence, that remembers. I produce self-portraits as an act of presence and resistance. Through my body, I question the place of women in a patriarchal society that insists on silencing us. Photographing myself is, at once, a form of protection and exposure. It gives face to what is not said, but burns within.
Free walking is my process. That’s how physical displacement becomes thought. The city, the empty spaces, the forgotten corners, the cracks in reality, all of this guides me. The gaze emerges from the encounter. The image is not planned, but intuited. I feel before I compose. I listen before I photograph. And only then, when something pulses, I press the shutter.
I work with analog photography because the grain and the interval between shooting and developing connect me to the real time of things. I use black and white film as a language, and double exposure as a structure of thought. To me, layering images means layering experience, creating fissures between the visible and the imagined, between the body and the landscape, between the real and the symbolic.
My images speak of silence, not as absence, but as matter. Silence is what vibrates between one layer and another of exposure. It is what crosses the body and echoes in the landscape. My most recent works explore this visual listening: a way to resist the noise excess of the world while giving form to what insists on staying. What I seek with each series is not an answer, but an open question. I want the images to reach the viewer in the realm of the sensitive, the unstable, the intimate. To awaken memories, affections, presences. To create possible worlds.
I make photography my way of existing: ethical and sensorial. What moves me is the desire to create images that, even in their fragility, resonate. That do not simply show, but remain. And that may become seeds of change.